A Dialética da Libertação: Anarquismo, Existencialismo e Descentralismo.
O que é o Existencialismo? - Parte 1 - Introdução Livre e Errática ao Existencialismo
"Não há liberdade lá fora na sociedade, apenas liberdade interior" - charlie777pt
1- Preâmbulo
O existencialismo nasceu da necessidade do homem moderno, de possuir um conjunto de valores, como um novo sistema de crenças em que poderia confiar, com o propósito de adaptação à complexidade da sociedade moderna, onde o racionalismo não tem mais lugar.
Esta era de guerra de informação. em que é impossível distinguir o que é verdadeiro do que é falso, alienando o espírito da humanidade com uma ambiguidade psicológica que bloquea a vontade individual, e como tal está na hora de nos concentrarmos mais no nosso sentido de liberdade e escolha de vida, como condutores da nossa segurança psicológica.
"A consciência crescente é um perigo e uma doença." - Friedrich Nietzsche
O existencialismo é uma reflexão antropológica e filosófica sobre a natureza e a existência do homem, e é a resposta à questão ética da condição humana, condenada a assumir a responsabilidade interna das suas escolhas e pelos resultados das suas ações.
"O Homem nasce livre e responsável pelas escolhas para a sua Existência, que modificam e prevalecem sobre a sua Essência" - charlie777pt
Um existencialista é uma pessoa que valoriza a independência de espírito e a liberdade de movimento acima de qualquer outra coisa na vida, e é contra restrições impostas às suas próprias convicções, mostrando algumas crenças comuns a qualquer anarquista ou descentralista.
O caminho para o Eu interior parece ser o único meio para mudar os sistemas e superar a opressão ou repressão e melhorar a condição humana.
Antes de entrarmos no assunto do Existencialismo, moldaremos o contexto filosófico em que o existencialismo emergiu sob o rótulo de Filosofias Continentais e que analisaremos no próximo post, vamos aqui rápidamente recordar quais são os principais ramos de conhecimento na Filosofia:
- Metafísica (O que é Realidade?)
- Epistemologia (Como o Conhecimento é formado?)
- Axiologia (Quais são os Valores da Vida?)
2 - O Homem Alienado
O existencialismo é uma filosofia da liberdade individual de escolher e tentar racionalizar e estabelecer um sentido na vida para preencher a nossa existência num mundo absurdo e irracional.
A Existência é um absurdo que não pode ser racionalizado, e a vida humana é ansiedade, solidão e culpa, fazendo da angústia gerada pelas nossas escolha um fato básico da vida, incluindo a libertação das filosofias transcendentais que negam o direito da escolha humana.
"Alienado para mim próprio. Não é natural, é mesmo antinatural e sem justificação, sem outro recurso para me salvar. Mas não voltarei a viver sob a tua lei; estou condenado a não ter outra lei além da minha. Não regressarei à tua natureza; todos os caminhos que nela se encontram a ti conduzem e eu não posso já seguir outro caminho que não seja o meu. Porque sou homem, ..., e cada homem deve descobrir o seu próprio caminho. "- peça de Jean-Paul Sartre The Flies“
Herbert Marcuse em seu livro "O Homem Unidimensional: Ideologia da Sociedade Industrial Avançada" critica tanto o capitalismo quanto o socialismo, pois ambos tentando aumentar o consumismo, a repressão social e eliminar o espírito ativista e individualista na sociedade moderna, resultando na crise social de hoje que ele previu.
Herman Hesse enfatizou a busca pessoal pela autenticidade no Ser pelo autoconhecimento, e o existencialismo procura os valores internos e o sentido e o sentido da vida, como uma natureza ambivalente da mente, criando o Absurdo de sua inatingibilidade para o Homem, mas que nós deve abraçar a perpétua exploração e desafio desta condição humana da Existência.
3 - A Responsabilidade como princípio ético
"Se eu não revelo a minha opinião sobre a justiça em palavras, eu o faço-o pela minha conduta" - Sócrates para Xenofonte
O existencialismo é uma filosofia sobre o Eu e o sentido da vida, que exercita o livre arbítrio e a liberdade de escolha com a contrapartida da responsabilidade pessoal, e está centrado na análise dos objetivos humanos no caminho da vida através deste mundo pela sua auto-organização autónoma.
Nossa Existência é ação para mudar nossa Essência (natureza) até o fim da vida, e as escolhas pessoais são obras únicas de arte como uma forma subjetiva de verdade, como uma luta com nossa natureza interior.
O Existencialista acredita que todos nascemos livres, mas condenados à ansiedade da escolha consciente permanente, espelhada pela responsabilidade inerente, sem as restrições das religiões, leis, regras ou tradições, que são consideradas regulamentações arbitrárias.
A sensação de ansiedade é aumentada por uma atenção não focada na condição auto-humana ou na consciência do mundo ao nosso redor, que é sempre subjacente ao processo de escolhas pessoais.
Esses conceitos parecem muito semelhantes às principais filosofias dos anarquistas, onde o caminho individual na sociedade está na luta pela liberdade e pela vida, contra os valores sociais e a estrutura centralizada de controle da sociedade ou do estado.
4 - A Verdade é Liberdade
"A única Verdade é a luta pela Liberdade" - charlie777pt
O filósofo alemão Martin Heidegger (1889-1976) é um explorador da natureza do Ser e da Existência, e sempre recusou a paternalidade ou o envolvimento no movimento existencialista.
Para Kierkegaard, o homem é inteiramente livre para escolher, para além do predeterminismo lógico que para Hegel, determinaria os fatos e também os comportamentos humanos e que a verdade será sempre subjectiva porque a luta pela liberdade será sempre ilimitada.
Não existe qualquer sentido ou projeto de vida ou uma essência para o homem, que se constrói a si mesmo como uma verdade para si próprio pelo que "a existência precede a essência", ou como dizia Jean Piaget no seu estrituralismo genético, também ao nível cognitivo a "ação precede o pensamento".
A Verdade não é produto da lógica mas uma emoção, uma paixão na afirmação da ação para sustentar os fatos.
"A vida é curta e, embora a verdade pareça remota, a verdade é longa: diga a verdade!" - Arthur Schopenhauer
Antes que possamos mergulhar na filosofia existencialista, devemos sentir a sensação de abandono ou abandonamento (abandonment), para a iluminação de que não existem entidades ou deuses transcendentes e onipotentes que construam nosso destino.
Nascemos livres, para sentir a ansiedade da escolha permanente e das suas consequências ,e somos os únicos arquitetos que moldam o nossos destinos através de nossas ações, pensamentos e experiências.
O existencialismo é focado no propósito e significado da vida e da existência, com escritores do realismo como Albert Camus, Franz Kafka, T.S. Eliot, Boris Vian, com o seu expoente nas obras do grande mestre da literatura Fyodor Dostoevski, transpondo para as suas obras os eventos e personagens da vida real
Sartre foca-se é na moral das ações, em que o homem deve totalmente responsável por aquilo que ele é na sua Existência para transformar a sua Essência.
"O homem é não apenas como ele se concebe, mas como ele quer que seja, como ele deseja ao impulso para existência; ou seja, o homem não é nada mais o que ele faz, não é mais do que seu ato. O homem nada mais é do que o seu projeto; só existe na medida em que se realiza; não é nada além do conjunto de seus atos" - Jean-Paul Sartre
O existencialismo revelou-se em vários autores com diferentes faces desde Kierkegaard que era um moralista religioso, Heiddeger um fenomenologista que mais tarde se tornou em Nazi, Nietzsche, um relativista agnóstico anti-cristão, e Sartre ou Camus caracterizados pela amoralidade e ateísmo.
Para Sartre, a Autenticidade vem da Liberdade de Escolha, que constrói nossos valores e molda nosso projeto para a vida (baseado no conceito de "grounding" de Heidegger) com nosso desejo de Ser (de liberdade e relação com objetos) e Ter (posses como símbolo de si mesmo).
Heidegger viu a essência da tecnologia como uma estrutura para o modo do Ser e o conceito de Dasein (Existência), em que fazemos a partir do que somos feitos, com a infinita possibilidade da potencialidade da nossa imaginação para moldar o futuro, sempre condicionada pelo passado.
Kierkegaard vê as etapas essenciais da vida como uma dialética entre a Estética (transformar o tédio numa perspectiva interessante), a Ética (separar o bem / o mal das regras externas) e a religião (o paradoxo da relação com Deus(es))
"A Existência com outros seres humanos pode Ser como o verdadeiro Eu, e Não-Ser como um falso Eu" - charlie777pt
5 - Ser ou não Ser?
Por outro lado, Kierkegaard enfatizou o conceito da inevitabilidade da Morte que revela o Eu autêntico e que a Existência não pode experimentá-lo, mas como sendo apenas uma maneira de lidar com isso com a nossa atitude ou Ser, com um modo autêntico de aceitação ou por uma recusa que leva ao não-Ser.
O Futuro é a nossa própria escolha irreversível, e a autenticidade da Existência molda nossa Essência (a Ser) e, no meu ponto de vista, a inautenticidade acumula sombras no nosso Não-Ser, como uma abnegação para Existir, como vida não vivida.
E para terminar este post de pensamento errático, aqui fica uma figura meio-psicótica para refletir sobre sobre a velha questão do "Ser ou não-Ser" nas nossas escolhas para as nossas ações, que traçam o destino da nossa vida e da nossa Essência.
De propósito, para evitar mais angústias ao público leitor (lol), evitei por aqui na figura a questão do "Ter ou não-Ter" que também é mais um fator de complexificação das escolhas e decisões nas nossas vidas que atrás referi como o conceito sartriano do nosso desejo de Ser (de liberdade e relação com objetos) e Ter (posses como símbolo de si mesmo).
E nos próximos posts vamos voltar a um pensamento mais ordenado para refletir sobre as várias filosofias que influenciaram o(s) existencialismo(s), a sua história, os seus autores, incluindo uma maioria que sempre refutou o rótulo de existencialista.
Depois iremos falar do Humanismo e suas ligações ao Existencialismo, as suas relações com o individualismo, o anarquismo e a filosofia do descentralismo.
Video Curto:
O que é o Existencialismo?
Video Longo (Em Inglês) :
Rick Roderick - Lecture One: The Masters of Suspicion
A Dialética da Libertação: Anarquismo, Existencialismo e Descentralismo.
Artigos publicados:
Introdução à Dialética da Libertação: Anarquismo, Existencialismo e Descentralismo
I - Anarquismo
- O que é o Anarquismo?
- A História do Anarquismo
- Parte 1 - Pré-Anarquia - Revolução Social
- Anarquia: Revolução Contra o Estado
- A Anarquia Hoje
- Índice e Conclusões da part 1 - Anarchy
II - Existencialismo
- O que é o Existencialismo?
- Parte 1 - Introdução Livre e Errática ao Existencialismo- Este Post
Próximos posts da Série:
II - Existencialismo(Cont.)
- O que é o Existencialismo?(Cont)
- Parte 2 - História Breve do Existencialismo
- Parte 3 - A Filosofia do Existencialismo
- Parte 4 - O Medo da Liberdade de Erich Fromm
- Os "Existencialistas"
- Part 1 - Os Jogadores
- Part 2 - Jean Paul Sartre - O Homem do Século XX
- Humanismo e Existencialismo
- Existencialismo e Anarquismo
- O Futuro: Pós-Humanismo, Transumanismo e Inumanismo
III - Descentralismo
- O que é o Descentralismo?
- A Filosofia do Descentralismo
- Blockchain e Descentralização
- Anarquismo, Existencialismo e Descentralismo
IV - Dialética da Auto-Libertação
- O Congresso da Dialética da Libertação
- Psicadelismo e movimentos Libertários e Artísticos
- Psicanálise e existencialismo
- O movimento antipsiquiátrico
Excelente análise charlie777pt, como é habitual da tua parte.
Obrigado man.
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