Eu andei muito pelo mundo. Andei demais e ficava tão cansado, que desejava fugir para longe de mim, mas não conseguia. Deixei meu país algumas vezes, conheci lugares, culturas, pessoas e ideias. Não conheci ideais, porque eu mesmo não os tinha presentes ou, se os tinha, estavam adormecidos, presos em algum submundo que me habitava, longe de meu alcance. E eu tinha alguns submundos. Não, não, eu tenho muitos submundos. Por isso continuo andando, mesmo parado.
Eu me lembro que não tinha planos quando me lançava no mundo. Tudo acontecia a esmo. Eu ia e vinha, sem linha reta. Fantasma cheio de solidões tão concretas que não havia tempo para pensar em como amainá-las. Eu só continuava com os planos que não eram realmente planos: fugir.
Mal eu chegava a qualquer lugar, queria conhecer outros. Ou seja, eu não plantava sementes, não colhia frutos, não fincava raízes. Eu era superficial. Nada saciava essa minha sede de buscar o “inbuscável”, do desejar o indesejável, do querer o “inquerível”, do encontrar o “inencontrável”, ou seja, eu mesmo. Eu só queria sair dos locais em que me encontrava, apenas sair. E saía. Aportava aqui e acolá, sem entender o abrir da boca de ninguém. Sem compreender os sons emitidos por outros nativos que não os meus nativos conhecidos. Não dos nativos de minha terra seca em mim. Eu só escutava os sons, sentia a ânsia do outro em se fazer entender. Mas como entender se eu não me entendia? Sentia-me perdido, prisioneiro de uma liberdade sem ação. Pior ainda, de uma liberdade sem função.
Mas o tempo é implacável e passa. Nos entrega raízes em cadeiras de rodas, olhos biônicos em óculos fundo de garrafa e uma ranzinzice que dá pena a quem nos cuida com ingratidão, não porque querem, mas por pura vingança da rabugentice fedida que vomito todos os dias em doses cavalares. Enfim, anos se passam e tudo o que resta, depois de tantos planos vazios e liberdades sem incumbência, é a solidão e a perdição de se andar pelo mundo parado, de sonhar sonhos amargos, de não poder consertar as ilusões concretas que me assombravam. Hoje, tenho a chave do entendimento para dar à vida objetivos, mas não tenho o vigor da juventude neste corpo decrépito e malcheiroso. Meus planos para o futuro pararam no passado, se é que eu os tinha, e meu presente continua sem qualquer atribuição, aguardando o trem que me levará para o único lugar aonde todos vão, mas nem isso a vida me traz com benevolência e me faz esperar impacientemente. O tique-taque do relógio é assustador e interminável, porém, o pior mesmo, é ver tudo em preto e branco. Tudo morto em mim e lá fora.
Abraços, @manandezo!
Publicação de 03 de agosto de 2017.
@manandezo Gostei....bonito conto , muito bem escrito...parabéns
Obrigado, @josferod2! Inspiração que tive depois de ler um comentário aqui e ali. Foi bom!
Que lindo! Essa busca nunca termina. E a cada resposta que encontramos, temos outra pergunta para respondermos. Isso é bom. É o que move o ser humano e o que não nos deixa estagnados.
Forte abraço, querido Manandezo!
Verdade absoluta, @cleateles! Nunca paramos, sempre queremos, sempre inventamos moda, sempre questionamos, nunca aprendemos... nunca mesmo? Sim, aprendemos o que é devido. O restante da lição vem depois, com mais açúcar, ou mais sal. Nós aplicamos o sabor de acordo com nossos atos.
Beijos, querida amiga linda! 💙
Olá, @manandezo
Parabéns, teu texto foi mencionado en Post Steemit recomendados en Português. 6 /Agosto/2017
Obrigadas pola túa participación na comunidade lusófona do Steemit e túas aportacións.
Teu escrito nos trae ó recordo eses días que unha quere fuxir de si mesma e remata abafada na melancolía.
Abraços dende a Galiza.
Se queres, podes recomendarnos contido en calquera variedade dialectal do Português e gañar SBDs. Mira cómo