Anime de ficção científica tratando de temas como internet, tecnologia, evolução, solidão e realidade.
Direção: Ryūtarō Nakamura| Gênero: Ficção Cyberpunk, Psicológico
Ano: 1998 | Nota no IMDB: 8,2/10 |Episódios:13
ESSE TEXTO CONTÉM ALGUMAS INFORMAÇÕES QUE PODEM SER INTERPRETADAS COMO SPOILERS (apesar de eu ter evitado colocar as partes vitais da trama)
Serial Experiments Lain é uma série de anime muito conceituada mundialmente e ainda hoje faz muito sucesso entre as gerações mais novas de fãs de anime, permanecendo como clássico absoluto do gênero. Talvez seu sucesso garantido ainda vinte anos depois venha justamente do fato de que os temas abordados pelo anime sejam – mais do que nunca – válidos e dignos de problematização.
A protagonista que dá nome à série, Lain Iwakura, é uma garota bastante introvertida e com certo bloqueio nas relações sociais. Ela vive com poucos amigos e mesmo em casa é solitária, pois convive com um pai obcecado com seu trabalho em computadores, uma mãe fria e ausente e uma irmã com quem não se pode dizer que tenha uma relação próxima. Lain tem apenas 14 anos e frequenta a escola como qualquer garota comum, mantendo seu padrão silencioso de poucas companhias e interesses.
O enredo começa a tomar seu rumo quando boatos correm pela escola falando em e-mails enviados por uma estudante já falecida chamada Chisa Yomoda. Curiosa com o fenômeno, a protagonista, pouco interessada em computadores, decide ligar o seu antigo Navi (nome dado para os computadores) para verificar se havia alguma mensagem semelhante. Fazendo isso, ela verifica que há uma mensagem da falecida Chisa dizendo que não morreu, mas que abandonou seu corpo e vive agora no mundo virtual onde encontrou Deus.
A partir do ocorrido, o envolvimento de Lain com a rede começa a se intensificar cada vez mais. Na série, o mundo utiliza uma rede que é chamada de Wired que é o resultado da soma de toda a informação; todas as redes de comunicação habitam essa dimensão extra de modo semelhante à internet no estágio atual. Contudo, a série explora a possibilidade de que há níveis de ampliação do domínio da Wired em relação à realidade, que é um dos argumentos principais na trama.
Lain se encontra penetrando cada vez mais nos submundos da Wired quando eventos misteriosos começam a ocorrer em crescente intensidade. O que parece ser uma espécie de transtorno dissociativo de personalidade acaba se revelando algo muito mais profundo e abrangente contido dentro da personagem. Aos poucos, as barreiras entre a Wired e o mundo real ou mesmo entre Lain e a virtualidade começam a cair, fazendo questionar todos os alicerces da percepção, da memória, da sociedade e de seu futuro dentro do que é que seja a realidade.
O anime busca na ciência, em personagens reais como Vannevar Bush, Timothy Leary, John C. Lilly e outros as referências para o desenvolvimento tecnológico alcançado no mundo do anime. Noções de transmissões de dados, de comunicação e de expansão da consciência encontram lugar efetivo na evolução tecnológica, levando a uma ideia de que os humanos estariam agindo como neurônios comunicando informações entre si a fim de fazer o próprio planeta consciente através do despertar da consciência terrestre. A Wired se encontra no seu sexto protocolo e às portas de entrar no sétimo, o que, por forças invisíveis e conspiratórias reveladas no anime, implica numa enorme transformação global. Partindo das noções de inconsciente coletivo de Jung, elabora-se uma possibilidade de fazer esse inconsciente, partilhado através das ondas da chamada Ressonância de Schumman, torne-se consciente e a Wired se funda com o mundo real, fazendo-se acessível sem a necessidade de qualquer instrumento. Todos estão conectados; você é apenas um corpo.
Outro ponto focal e atrativo para o público jovem que consome esse tipo de mídia é o do isolamento social, da introspecção, timidez e introversão. Indo um pouco mais longe, apesar de o anime dar suas próprias explicações para o que se passa com a protagonista, pode-se muito bem encarar a trama como referência aos transtornos mentais que têm em sua etiologia ligação com situações de isolamento e do afastamento da realidade. A crítica à modernidade e à realidade cada vez mais substancial do que antes era um mundo em separado – a internet – atinge um ápice na ideia de perda de personalidade em meio ao fluxo de dados; o desaparecimento das bordas entre dois mundos cada vez mais integrados entre si. Abre-se o pensamento para o eu que habita o mundo dos dados e o que ele significa para o eu que habita o mundo em que o coração palpita. Surgem questionamentos: a persona se encontraria enfraquecida no ambiente virtual de modo que o ego encontraria modos anônimos ou disfarçados de fazer fluir os impulsos reprimidos na sociabilidade real? Qual o eu real? O que é a realidade quando somos jogados entre a espacialidade do mundo e a intensidade de arquiteturas cibernéticas infinitas? No que isso tudo colabora para uma eventual dissociação da personalidade ou na erupção de uma esquizofrenia latente naquele em que as camadas defensivas do ego já foram enfraquecidas por anos de inadaptação social?
Serial Experiments Lain oferece todos os instrumentos necessários para uma análise profunda de nossa realidade, levando à reflexão sobre o futuro da tecnologia e da espécie humana. O anime ainda vai muito além do que foi compartilhado neste texto, tratando de vários layers (que também é o nome dado aos episódios), como o da própria religião, da percepção, da memória e relações humanas. Em seus 13 episódios, a série consegue abranger muito bem uma série de temas profundos.
Em 1999, foi lançado o mangá intitulado *The Nightmare of Fabrication”, escrito por Yoshitoshi ABe, que foi responsável pelo design de personagens no anime. A série animada foi recebida com um pouco de estranheza, mas aos poucos assegurou seu status entre os grandes nomes do gênero.
A série faz muitas referências ao mundo real, mencionando nomes de cientistas, projetos científicos e até o incidente de Roswell. O mundo dos computadores do anime fazem alusão clara à Apple, marca usada pelos desenvolvedores de Lain. As linguagens de programação que aparecem também são referentes a linguagens reais. Chiaki J. Konaka, um dos escritores da série rastreou suas influências até Godard e filmes de terror como O Exorcista, Nas Sombras da Noite (1970) e A Casa da Noite Eterna (1973).
Esse é um anime que traz um retorno muito bom a quem assiste. Além de sua trama excepcional e dos conteúdos profundos tocados por ela, a animação é um trabalho muito bem feito. Serial Experiments Lain entraria facilmente para uma lista de melhores animes se feita por mim.
Referências
FONTE 1
[FONTE 2](https://www.imdb.com/title/tt0500092/
Imagem 1
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Imagem 3
Mais postagens minhas sobre animes:
**Cowboy Bebop | Fate Apocrypha | Ghost in the Shell: Stand Alone Complex | Mushishi | Noir | Paranoia Agent | The Ancient Magus Bride **
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Parei no episódio 7 ou 8, há cerca de 10 anos. Lembro que estava bacana, mas muito lento. Acho que vou recomeçar. @posthero
Vale a pena. Não sei que idade tinha quando assistiu, mas às vezes é melhor assistir com mais idade para apreciar melhor a parte conceitual. Eu vi ele pela primeira vez há 8 anos e ver agora foi bem mais proveitoso.
Obrigado pela leitura e comentário!